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CARTAS DE LONDRES
janeiro 30, 2004
  Hutton e José Manuel Fernandes O director do Público devia ser mais rigoroso ao dar lições de rigor aos outros... Na verdade, o juiz Hutton diz que o gabinete comunicação de Blair PODE ter influenciado 'inconscientemente' o trabalho do Joint Intelligence Committee. O que quer que isso queira dizer. E como referimos no post anterior, Hutton 'absolve' indirectamente o conjunto da cobertura pela BBC da questão do Iraque, ao dizer que o facto de as queixas precisamente nesse sentido de Allastair Campbell, o conselheiro de imprensa de Blair, serem excessivas, não invalidava a necessidade de ter em conta a sua queixa especifica contra Andrew Gilligan e o programa Today.
Enfim, Hutton com certeza não se irá queixar, afinal ele achou que era uma simples questão de linguagem sem qualquer impropriedade, a forma como no Dossier de Setembro o 'pode' e 'fontes alegam' das informações originais dos serviços secretos sobre as ADMs iraquianas foram transformados em 'é' e 'fontes afirmam'. Como na história do Gorbachev, em que lhe pediam para descrever o estado da economia russa numa palavra, e ele respondia com um sonoro 'good!', mas para logo acrescentar que se lhe pedissem para a descrever em duas palavras então teria de dizer 'not good!' Uma palavra a mais ou menos...
Portanto, pela minha parte, vou continuar a esperar pacientemente por ADMs iraquianas em quantidades industriais e por provas claras de que a ocupação americana do Iraque foi um sucesso, antes de reconhecer que a cobertura da guerra, e da guerra antes da guerra, por parte da BBC, foi desqualificada por este veredicto realmente exemplar. 
janeiro 29, 2004
  Hutton e a BBC A única verdadeira visada no inquérito é a BBC. O director demitiu-se ontem. E Blair já anunciou que vai rever a respectiva charter para ter em conta as conclusões do inquérito. É o natural impulso do momento. Mas não nos parece que qualquer tentativa de reforço do controlo político da estação vá muito longe. Afinal o próprio Hutton deu o seu selo ao essencial da cobertura da questão do Iraque pela estação. O Independent e o Guardian de hoje falam de whitewash. Eu não sei se iria tão longe, mas lá que ontem nevou muito em Londres, lá isso nevou… 
  Hutton e James Bond Em relação à manipulação da informação dos servicos secretos no sentido de reforçar o caso a favor da invasão do Iraque, lord Hutton limita-se a referir que a pressão de Downing Street para apresentar um argumento forte em favor da guerra pode ter influenciado ‘subconscientemente’ [sic!] os responsáveis da inteligência no gabinete do primeiro-ministro, a quem formalmente coube a responsabilidade final pelo famoso Dossier de Setembro sobre as ADMs. É verdade que as conclusões do inquérito admitem mais adiante que poderá ter havia sexing-up do dossier, se se quiser significar com isso que houve pressão para usar a linguagem o mais forte possível ao apresentar a questão. Mas não ao ponto de se poder dizer, como fez o jornalista Andrew Gilligan, que teria havido a inclusão de informações que se sabia serem falsas. De facto, pensar que o gabinete do primeiro-ministro alguma vez teria dito por escrito ou mesmo verbalmente aos responsáveis dos serviços de informações para mentirem é realmente estabelecer um patamar de culpabilidade muito alto. Dirão que é com provas que se faz a justiça. Mas como o próprio juiz Hutton refere, as informações militares, o DIA, em que se precisamente se encontrava a maior concentração de especialistas em ADMs, apontou vários problemas no Dossier, e nomeadamente avançou com uma série de correcções em relação à alegação de armas prontas a serem usadas em 45 minutos. Porém, segundo o juiz Hutton o facto de este parecer não ter sido tido em conta apenas mostra que os reponsáveis dos serviços secretos estavam convencidos da veracidade da alegação, e não, como alternativa pelo menos tão provável quanto a anterior, que estavam sob pressão de Downing Street, e, por isso, não quiseram fazer as alterações devidas, por saberem que estas seriam politicamente inconvenientes.
Na verdade, o problema de base, tem a ver com o James Bond. Que o mesmo é dizer com a forma como a opinião pública vê os servicos secretos, que Tony Blair usou para reforçar a sua posição a favor da invasão do Iraque. E que passa pela ideia de que os servicos secretos são constituídos por seres especiais, e que a informação secreta é necessariamente melhor do que a informação aberta. Porque outra razão é que seria secreta. Como refere Sir Rodric Braithwaite, que em tempos ocupou o mesmo cargo de John Scarlett, que como responsável pela célula de informação de Downing Street foi o ‘autor’ do Dossier de Setembro, num, como sempre bem-humorado, discurso recente - a informação secreta não é intrinsecamente melhor ou pior do qualquer outro tipo de informação. Não é, nem mais verdadeira, nem mais profunda por ser obtida pelos serviços de informação. Na verdade, as cautelas que a rodeiam devem ser maiores. Daí que questões de linguagem sejam essenciais. Os relatórios dos serviços secretos são sempre pontilhados de imensos condicionais, têm uma linguagem extremamente cautelosa. Se Andrew Gilligan, um homem dos tabelóides, não foi exactamente cuidadoso no seu agora famoso comentário sobre a questão do Dossier de Setembro no Today Show na BBC (às 6 de manhã), e, embora curiosamente ninguém fale disso, no texto que escreveu no Daily Mail, a verdade é que o governo britânico foi também muito pouco cuidadoso na principal peça da sua argumentação a favor do Iraque junto da opinião pública. Isso nunca aparece realçado nas conclusões do relatório.
 
  Hutton e Sim, Sr. Ministro O juiz Hutton correspondeu à imagem típica do inquérito político retirada do Sim Sr. Ministro, uma série que ainda hoje é dos melhores guias para a realidade da política britânica. Mas a verdade é que as conclusões do inquérito excederam as melhores expectativas do campo pró-Blair. Nas conclusões Hutton vai ao ponto de dizer que não acha que tenha havido algo de irregular na forma como o ministério da Defesa lidou com a divulgação do nome do Dr. Kelly, que segundo o juiz foi a principal motivação do seu suicídio. Ou seja, o jogo de advinha em que o gabinete de Geoff Hoon entrou, ao dar aos jornais pistas sobre quem era a fonte da reportagem da BBC sobre o Dossier de Setembro, e garantia que confirmaria o nome correcto, é algo perfeitamente normal! Ora, o facto do ministério da Defesa não ter avisado David Kelly de que o seu nome iria ser conhecido, que merece a censura de Hutton, resulta precisamente desta estratégia dúplice de evitar a responsabilidade pela sua denúncia, que o inquérito diz nunca ter existido. Se não houve nada de mal com a divulgação do nome, porque não foi feita com um comunicado à imprensa e sem jogos? Este facto põe evidentemente em causa a credibilidade, senão do inquérito, pelo menos das suas conclusões. O mínimo que se pode dizer é que estas últimas são claramente mais compreensivas em relação aos políticos do que em relação aos jornalistas e editores da BBC e ao próprio Dr. Kelly. 
  London Town Escrever de Londres é outra coisa. Estar a viver precariamente numa grande cidade dá-nos toda uma perspectiva diferente sobre a existência! Viver num sítio onde toda a gente fala, quer dizer quase toda a gente fala, quer dizer, onde era suposto toda a gente falar inglês é outra coisa! Depois todos sabemos que Londres é neste momento o centro das atenções por causa de um famoso inquérito que quem se interessa pelos grandes acontecimentos mundiais não pode deixar de acompanhar com interesse. O Dianagate. O quê? Perguntarão alguns mais distraídos. O caso da Diana traduzo eu… Do assassínio da Diana! O juíz encarregue do caso já anunciou que vai mesmo interrogar a Família Real e tudo, se for preciso. Por mim já sei qual é questão chave que quero ver respondida. Se ela sabia que eles andavam a tentar acabar com ela, como é que a conseguiram convencer a não pôr o cinto quando se sentou no maldito Mercedes? Que, por sinal, é um carro alemão, como a família real inglesa...
 
Este é um blog liberal, cheio de convicções e à procura de patrocínios. Temas? As coisas que realmente (me) interessam. Procuramos, acima de tudo, seguir as máximas do nosso João das Regras «Olhai, porém vede!» e do imortal bispo inglês Joseph Butler, «Things and actions are what they are, and the consequences of them will be what they will be: why then should we desire to be deceived?» Divirtam-se, que nós também. Comentários: BrunoCardosoReis@sapo.pt

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