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CARTAS DE LONDRES
dezembro 29, 2004
  Aquela que partiu Tinha nome de sabedoria antiga e deixou-nos poemas como este que tão bem se lhe veste com um pequeno ajuste...

Aquela que partiu
Precedendo os próprios passos como um jovem morto

Deixou-nos a esperança.

Ela não ficou para connosco
Destrui com amargas mãos o próprio rosto
Intacta é sua ausência
Como a estátua de um deus
Poupada pelos invasores de uma cidade em ruínas

Ela não ficou para assistir
À morte da verdade e à vitória do tempo

Que ao longe
Na mais longínqua praia
Onde só haja espuma sal e vento
Ela se perca tendo-se cumprido
Segundo a lei do seu próprio pensamento

E que ninguém repita o seu nome proibido.

[Sophia, Mar Novo, 1958]

E também eu vou partir por uns dias, pelo menos...
 
  Balanço e perspectivas: Mundo Muito tem sido escrito de qualidade lá fora sobre este tema. Para além de revistas e jornais, vale a pena ver, por exemplo, o site do Council on Foreign Relations.

A reeleição de Bush significa que nos próximos quatro anos não se poderá contar muito com Washington para avançar na maior parte dos problemas importantes a nível internacional. Mesmo assim é preciso tentar, nomeadamente nas únicas áreas que parecem realmente preocupar Bush e companhia – a proliferação nuclear e o terrorismo. E que são realmente importante. Embora provavelmente o máximo a que se possa aspirar é que se evitem grandes asneiras.

Esperemos que o próximo ano traga uma boa reforma da ONU. Infelizmente duvido que tal seja possível, com Bush II a opor-se a grandes avanços. Mas as propostas dos dois painéis, o da reforma instutucional, e o da reforma das relações com a sociedade civil, foram de qualidade e bom senso. Como se tem vista numa quantidade de aréas, desde a gestão de conflitos à reconstrução pós-bélica, passando pelo apoio a todo o tipo de situações de emergência em catástrofes naturais ou ao problema crescente das migrações, os grandes problemas são globais e exigem soluções, ou seja, regras e instituições, globais.

Esperemos ainda que o novo ano traga um avanço decisivo no sentido do reforço da União Europeia. A Europa adquiriu uma importância maior perante o vazio de liderança construtiva a nível global. A discussão sobre a ligação com os EUA no contexto da reforma e reforço da União não faz qualquer sentido. A Europa deve ser forte para servir os interesses, valores e ideias dos europeus. Que, como se viu, por exemplo, no caso do Iraque, estão bem mais unidos do que aquilo que algumas elites fixadas no passado querem deixar crer. Esses valores e interesses são partilhados com, pelo menos, um parte significativa, dos norte-americanos. No entanto, essa é uma questão secundária. A Europa não deve ser à partida hostil nem subserviente a Washington.

O problema do Iraque está para dar e durar. E como previam os críticos, o desastroso planeamento do pós-guerra, se é que se pode falar de tal coisa, gerou uma situação de caos que continua a criar problemas em toda a zona envolvente. Por outro lado, o muro resolveu o problema de segurança imediata de Israel, mas não o problema regional da hostilidade dos Estados árabes e, cada vez mais, do resto do mundo. Que outra coisa se poderia esperar face à colonização forçada das zonas palestinianas? Mas há sinais encorajadores, sobretudo da parte de quem realmente pode faz a diferença. Sharon está a arriscar muito capital político na sua estratégia de abandonar Gaza. Resta saber o que se seguirá. Ou seja, resta saber a quem Sharon está a mentir, se aos colonos, se ao exterior e aos trabalhistas. Isto, claro, pressupondo que ele mesmo sabe...

O próximo ano trará também os dez anos do processo de Barcelona, com que a União Europeia tem procurado estabilizar a zona do Mediterrâneo. O Médio Oriente, o Mundo Árabe e Islâmico continuarão a ser centro de atenções. Apesar de tudo há sinais encorajadores, particularmente com o crescente acordar das sociedades civis no países árabes mais próximos da Europa. O sucesso mais óbvio desta mudança de regime através do poder de atracção da Europa é, claro, o caso da Turquia. Mas há outros, como Marrocos. O melhor reconhecimento deste relativo sucesso é o «plano» de Bush para uma Parceria para o Grande Médio Oriente, que copia descaradamente as ideias e até a terminologia europeia (desde logo a própria ideia de parceria). Só falta mesmo igualarem o volume de investimento e ajuda. Os europeus devem estar dispostos a ajudar os americanos – ensinando como é que se faz – mas não a avançar com projectos conjuntos. A imagem do governo americano no mundo árabe tornaria essa cooperação contraproducente! E se as pressões externas são importantes, o essencial será que, tal como na Turquia, nestes países se faça uma transição «pactada» no modelo espanhol, que dê garantias ao regime, aos militares, e aos islamistas. Quem viver, verá...
 
dezembro 28, 2004
  Balanço e perspectivas: Portugal Como previ os amigos de Santana Lopes criaram-lhe graves problemas. Na verdade um deles, Henrique Chaves, praticamente derrubou o governo. Embora apenas porque ele já estava completamente minado por sucessivos casos. O regime reequilibrou-se, o que é bom, independentemente de se saber se a decisão de nomear Santana foi boa (continuo a pensar que não foi). Como previ também, com Santana a política nacional está mais agitada e polarizada. Até porque muita gente de direita, que diz cobras e lagartos do homem em privado, vem agora tentar salvar o convento partidário.

Para quem ainda tinha dúvidas sobre o crédito do governo agora demissionária elas ficaram esclarecidas com a crise orçamental. Há um mês procuravam convencer-nos que a crise tinha passado, e as finanças públicas permitiam largueza. Agora vê-se que o déficit estrutural continua a crescer e há que continuar a vender anéis para manter os dedos. Claro que este problema não é criação apenas deste governo, como não é do governo anterior, ou do de Guterres. É um problema de fundo do país, e por isso é mesmo recorrente. As dificuldades de Costa Cabral ou de Fontes e Braamcamp no século XIX estão aí para nos lembrar como é difícil, num país em que todos exigem tudo do Estado, fazer que se pague pelo serviço público como se paga pelos serviços privados. É verdade que há abusos e desperdícios. Mas enquanto o público não for percebido como um investimento na comunidade em vez de ser terra de ninguém, não se conseguirá avançar muito. E quem pensa que a noção de bem comum é incompatível com progresso económico e iniciativa, devia ir à Noruega, Suécia ou Finlândia.

Importa lembrar onde, apesar de tudo, chegámos: estamos ainda entre as maiores economias do mundo e de acordo com índices de desenvolvimento e qualidade de vida fazemos parte de uma pequena minoria afortunada à escala global. Convém lembrar também, no entanto, que tal se deve muito a esforços individuais e ilhas de qualidade; e não pouco às escolhas erradas de outros – o delírio trágico comunista. Mas agora cada vez mais está toda a gente a jogar o mesmo jogo. Se não necessariamente, como dizia Fukuyama, no sentido da democratização, pelo menos no sentido da adopção de aspectos essenciais da economia de mercado.

Esperemos por isso que no século XXI sejamos capazes de fazer aquilo que não fomos capazes de fazer no século XIX. Ao contrário, por exemplo, dos países nórdicos com os quais partilhávamos então muitas características, com o fontismo modernizámos a infraestrutura material, mas não, não suficiente pelo menos, o capital humano. Ora hoje ele é mais indispensável do que nunca. Para isso é preciso melhor educação, com aposta nos conhecimentos indispensáveis e incentivos ao melhores e ajudas aqueles com mais dificuldades. É preciso aprender com os outros, nomeadamente na promoção de marcas nacionais ou na formação contínua. É preciso acabar com uma sociedade dos doutores e engenheiros, com a mentalidade mesquinha de quem tem muito orgulho no canudo mas nada mais. É preciso melhor gestão pública (e privada, já agora), com metas e processos de selecção dos gestores bem claros.

Dito isto, convém ser exigente com a política e os políticos, mas sem cair em excessos de moralismo ou devaneios passadistas sobre os grandes estadistas de antanho. Roosevelt e Churchill foram vilipendiados em vida, como todas as grandes figuras do passado. E, como nos recordam os Federalistas americanos: ‘Se os homens fossem anjos não haveria necessidade de governo’. Não vale, portanto, a pena pedir o impossível, mas todos podemos fazer um esforço para melhorar o que existe. E a exigência começa connosco.
 
  Portugal, Espanha e a Europa Caro Luís

Não se trata de debater se as cortes de 1581 foram livres e representativas de acordo com os critérios de hoje. Mas sim se o foram de acordo com os critérios da época. É evidente que nelas apenas tiveram assento os partidários de Filipe II, geralmente bem pagos pelo seu incómodo. Notoriamente ausentes estiveram os partidários de D. António, aclamado rei aliás, no ano anterior por outras cortes. O que é tanto mais natural, quanto estavam demasiado ocupados a escapar para o exílio para evitar a morte certa.

Quanto às concessões de Filipe II/I ao seu reino de Portugal, elas eram isso mesmo, concessões, portanto livremente revogáveis. Como foram por exemplo pelo seu descendente Filipe V as que regiam os reino da coroa de Aragão no século XVIII, ou já no século XIX os foros das regiões bascas.

Quanto ao nosso direito de abandonar a União Europeia ele não merece qualquer discussão. E está explicitamente consagrado no novo tratado constitucional, ao contrário do que sucedia e sucede nos EUA. A ideia de que qualquer país da União Europeia seria impedido pela força de a abandonar não faz portanto qualquer sentido. Mesmo na Grã-Bretanha, aonde abundam os delírios preconceituosos sobre a União, esse direito de secessão pacífica nem sequer é discutido, e pode até em breve ser posto em prática, certamente em paz, e provavelmente até para alívio dos demais parceiros. O que os eurocépticos portugueses não parecem querer aceitar é que a questão da saída não se põe em Portugal, simplesmente porque os portugueses não querem, e se tiverem juízo não vão querer, sair da União.
 
dezembro 27, 2004
  O maremoto, Deus, a ordem internacional, e a Somália Já outros fizeram referência aos problemas filosóficos do costume nestas ocasiões. Eu diria que bem mais importante e pertinente nesta altura é discutir a forma como desastres desta escala ilustram sangrentamente a importância de um multilateralismo efectivo e eficaz, musculado mas não necessariamente apenas ou principalmente militar. É que como dizia a minha santa avó, fia-te na Virgem, mas corre!

De facto, mortes particularmente escandalosas foram no meu parecer as da Somália e países vizinhos, que o maremoto atingiu várias horas depois da Sumatra! No entanto, nada foi feito para avisar as pessoas. Claro que ter um estado funcional, com um sistema de protecção civil bem organizado (como nós, espero...), ajuda. Mas a criação de uma verdadeira agência internacional bem apetrechada no quadro da ONU, que juntasse o ambiente e a prevenção deste tipo de desastres, e não se limitasse à coordenação da ajuda internacional, seria um desejo bem adequado para o Ano Novo...

PS - Já agora, seria possível pedir para se deixar de exibir ignorância usando uma palavra japonesa para designar um fenómeno para o qual existe um termo português perfeitamente adequado - MAREMOTO?
 
  Quem não percebeu isto não percebeu nada II Este foi o ano do regresso da insurreição, armada e não só, como diz Andrew Sullivan, que conclui a sua análise de 2004 assim: Did anyone win? Well, the President did. But the insurgency against him — fanatically deadly in Iraq, peacefully feisty at home — merely took a deep breath. And fought on. Goste-se dela ou não, a insurreição é um facto que quem não percebeu, não percebeu nada (uma frase que tomo de empréstimo - ver poste anterior). E eu olhos para estes insurrectos com tão poucas ilusões como olho para Bush, esse outro revolucionário nacionalista radical que vê na violência, propagandística ou real, um atalho apetecível para resolver os grandes problemas do mundo.

 
  Quem não percebeu isto não percebeu nada I Obrigado ao Paulo Mascarenhas pela lembrança, de facto a Time de fim do ano merece uma leitura atenta (como aliás o número especial da sempre excelente Newsweek). De facto, quem não percebeu que Bush era um revolucionário em termos da política externa e interna americana das últimas décadas senão mesmo século, e um dinasta, orgulhoso membro de uma orgulhosa e poderosa família aristocrática, não percebeu nada...
 
dezembro 26, 2004
  Uma prenda de Natal O João Bénard da Costa dá-nos belas prendas todo o ano. No Natal não podia falhar. (Sou só eu, ou há mais quem hesite sexta-feira pela manhã: ler ou não ler a sua crónica? That is the question. Espreitar, talvez, mas eis a dificuldade, pois quem espreita acaba por ler e facilmente se perde em devaneios úteis...) Para quem estranhe o elogio, digo, é da época, senhores, é da época.
 
dezembro 22, 2004
  Santana merece uma segunda oportunidade... pela enésima vez! O João Miranda descobriu o melhor, ou será o único argumento para votar em Santana Lopes. Esqueçam tudo o que ele fez!!! Para grandes males, grandes remédios, de facto. Mas não foi precisamente este um dos argumento dos que defenderam a sua nomeação em Julho passado? E já agora será que devemos seguir o mesmo rigoroso método de análise para outras áreas, por exemplo empresas: esqueçam as contas olham só para o que os administradores dizem que vão fazer para o ano? É possível conceber algum tipo de análise ou processo de decisão rigoroso e responsável sem ter em conta passado e futuro, factos conhecidos e intenções afirmadas?
 
dezembro 21, 2004
  Perguntas simples O Tribunal Constitucional fez o esperado. Mas criou um problema complicado. Com uma interpretação tão restrita do que seja uma pergunta clara e simples vai ser difícil fazer referendos no futuro (bem hajam!).

Deixo aqui as minhas singelas sugestões para os referendos mais previsíveis no futuro próximo:

Europa?
Aborto?

E, pensando bem, nas próximas eleições de 20 de Fevereiro podia-se evitar a confusão habitual de siglas partidárias. Afinal a democracia é cá uma complicação, talvez até, descobrimos agora para gáudio da inteligência nativista, seja mesmo inconstitucional. Que tal simplesmente uma ou talvez, se possível, duas perguntas: Santana? (Para decidir a margem da derrota do PSD) e Sócrates? (Para decidir a margem da vitória do PS). Simples, não? Claro, sim?
 
dezembro 20, 2004
  Esclarecimentos aos leitores São dois, em resposta a perguntas que já surgiram em vários mails.

1. Porque não elogio mas tendo apenas a criticar cronistas ou bloguistas portugueses? Pela simples razão de que haveria muito mais para elogiar do que para criticar (no grupo evidentemente selecto dos cronistas que leio regularmente, quase tão selecto como o dos leitores deste meu blogue...). Porque criticar tem mais piada e acrescenta mais ao que há. E porque, ou a selecção é feita por sistema, caso do Paulo Gorjão, ou torna-se rapidamente suspeita num meio pequeno como o português. Finalmente, as minhas críticas escolhem por regra alvos seleccionados, ou seja, pessoas que considero que vale a pena ler, apesar de discordar, por vezes ferozmente, do que opinam. A crítica também é uma forma de elogio.

2. Porquê as interrupções, e o que querem dizer (inclusive politicamente)? Querem dizer que fazer um blogue individual, especialmente quando se viaja pelo estrangeiro, é uma complicação. Quando abandonar a escrivaninha electrónica, por razões práticas ou outras, previno... (Por outro lado, fontes próximas do Inimigo Público tinham-me prevenido de que se preparava para acusar os bloguistas de esquerda de escreverem muito...)
 
  Contra Belém marchar, marchar! A mesma gente que andou a defender a dignidade da função presidencial há uns meses atrás, anda agora a atacar o Presidente Sampaio como se ele tivesse praticado um golpe de Estado! Um ministro em funções acusa o Presidente de caudillismo!!! Mesmo para quem já esperava algo do género supreende o ponto a que se chegou. Mas é bem a ilustração do desespero de quem não tem mais a que se agarrar.

Os governamentalistas e no sábado o próprio Santana Lopes vieram falar da demissão de ministros em Inglaterra como uma comparação pertinente. Ridículo! Na Inglaterra, a desacreditada Claire Short pode dizer o que bem lhe apetecer, desde que os deputados trabalhistas continuem a apoiar Blair. É por isso que se fala de sistemas parlamentares e sistemas presidenciais ou semi-presidenciais. Na Inglaterra não há dissolução de cada vez que um ministro se demite?! Pois não! Pela simples razão de que NUNCA HÁ DISSOLUÇÃO! Cabe ao primeiro-ministro fixar a data das eleições gerais e não o soberano. E, já agora, convém também lembrar que no sistema inglês quando um primeiro-ministro se demite, CABE AOS DEPUTADOS do partido maioritário ESCOLHER UM SUCESSOR NUMA ELEIÇÃO ABERTA. Nesse regime de parlamentarismo puro duvido que Santana Lopes alguma vez tivesse chegado a primeiro-ministro. Mais, se Blair é acusado de alguma coisa é de ter uma prática política presidencialista, de ter excessiva mão de ferro, e não de desgoverno. As demissões de ministros têm aliás sido raras.

Em Portugal, felizmente, temos um poder moderador. Um conceito bem liberal, que permite evitar bloqueios como os da Primeira República, esse regime parlamentarista perfeito que estranhamente ao fim de décadas a direita portuguesa veio agora descobrir ser afinal o seu ideal!!!! Porque será? Na Primeira República sempre houve uma maioria parlamentar “estável” do PRP-Partido Democrático e um completo desgoverno. Sempre que se chegava a um impasse caótico havia um caudillo a sério que resolvia a questão com um golpe de Estado. Claro que os apelos a mudanças no papel constitucional do Presidente são simples agit-prop, mas nunca é demais assinalar o seu ridículo.

Há quem ache vagas as explicações do Presidente. Mas neste aspecto o governo tem sido exemplar, e mesmo depois de demitido tem continuado a dar uma perfeita ilustração do desgoverno a que Sampaio se referiu. Veja-se o espectáculo do ora coligamos hoje, ora descoligamos amanhã, ou do ora vendemos património hoje ora cedemos amanhã. O governo de Santana Lopes tem sido exemplarmente coerente na sua incoerência crónica.

PS – Quanto ao caso norueguês que João Miranda foi buscar, esqueceu-se de assinalar o facto de que o primeiro-ministro trabalhista norueguês tentou formar governo, e apenas depois de isso se ter revelado impossível, se demitiu e cedeu o lugar ao novo primeiro-ministro conservador que tinha entretanto obtido apoio maioritário no parlamento. Ou seja, o caso prova exactamente o contrário daquilo que ele (ou pelo menos Paulo Portas, como Paulo Gorjão assinala) tenta argumentar. Mais um caso revelador do desespero da coligação de direita... corrijo, futura possível eventual futura coligação para formar eventual futuro possível improvável governo de direita.
 
dezembro 19, 2004
  De Retour Como devem ter reparado os encantos de Paris prolongaram-se, e os seus cansaços também. Paris estava fria, mas de cara solarenga. Parece que ainda não é desta que o modelo norte-americano de peace-keeping vai ser aceite pelo resto do mundo... Aproveitei para ver este terrível trio anglo-franco-americano no Grand Palais. Dois deles dedicaram-se muito ao Tamisa, not least ao cantinho em torno da ponte de Waterloo que me é muito querido. Internet ausente, nem sempre a ela apetece regressar pela carga de trabalhos que frequentemente representa. Isso, e problemas de acesso ao blogger e quase nos desabituámos. Mas alguma resposta era devida a mails e ao caríssimo Luís Aguiar Santos.

Sobre a União de 1580 e a União de 2005. Todos sabemos que as Cortes de Tomar de 1581 não foram exactamente livres nem representativas, ainda que o cenário tenha sido de qualidade superior ao de 1985 (Convento de Cristo v. Jerónimos novecentistas). Mas alguém contesta que a adesão à CEE em 1985 foi livre e livremente acordada? Claro que fazer parte de uma confederação assente na democracia faz toda a diferença em relação a uma União Dinástica sujeita ao arbítrio do soberano! Temos direitos garantidos e uma voz assegurada no centro. Podemos sair quando entendermos sem termos de enfrentar trinta anos de guerra pela independência. Isto são factos.

Liberdade de imprensa garantida pelos privados? Como é que ainda se pode defender isso depois do que se passou na TVI? Só não percebeu o que se passou quem não quis. E claramente foi o caso de vários blogues de direita. Claro que Paes e Amaral não ameaçou Marcelo directamente, mas este deixou claro que se sentiu pressionado, e tal nunca foi desmentido. O que se passou na RTP é fácil de perceber à luz das declarações de Morais Sarmento. E foi não só grave do ponto de vista da boa prática editorial, mas também da boa gestão. Ou será que agora é um boa prática empresarial não respeitar as competências próprias de cada um? A ideia de que as empresas privadas e os interesses particulares por si só resolvem todos os problemas do mundo e asseguram a existência de um sistema liberal é de um utopismo que emula bem o do marxismo, mas de sinal contrário. O problema actual na gestão pública resolve-se com gestores escolhidos por concurso pelas suas qualidades e para cumprir determinados objectivos.

Quanto à demissão do governo e à mais do que previsível campanha para fazer crer que foi Sampaio que subitamente se arrependeu de ter nomeado Santana Lopes, e não o primeiro-ministro e os seus ministros, amigos e ilustres filiados do PSD que criaram esta crise, comento em termos mais gerais a seguir.
 
dezembro 05, 2004
  Francófobos atacai enquanto podeis! Durante esta semana vou estar a rever as minhas lições de neo-gaullismo aqui. Paris vale bem um blogue, como dizia o Henrique IV, ou seria um missa?

PS - Infelizmente vou perder esta festa do blogue sem o qual a direita já não consegue viver. Vá quem poder!
 
  Burkeans for Bush? Cito umas passagens da critica na New York Review da obra mais recente de Himmelfarb (texto integral reservado a subscritores). Da autoria de Alan Ryan, um perigoso esquerdista anti-americano e especialista em pensamento liberal de Oxford (riscar o que estiver errado) : This is not an account of the British, French, and American Enlightenments, but a series of essays on Professor Himmelfarb's favorite British eighteenth-century philosophers; France is discussed only in an essay denouncing the philosophes as a gang of elitist, atheist, ultrarationalist utopians, while America gets one essay praising the Founding Fathers for borrowing their ambitions from the British rather than the French. The Roads to Modernity ends with a short epilogue in praise of compassionate conservatism as an embodiment of American Enlightenment ideals: what one might call "Burkeans for G.W. Bush." The United States remains the last best hope of humanity. The British, her readers will be sorry to learn, have "discarded" their former virtues, while the French "have never adopted" them.

Lindo não? Que capacidade de análise desapaixonada! Que impressionante demonstração de que os intelectuais norte-americanos que apoiam Bush estão longe do etnocentrismo! Querem mais?

The shortcomings of the French Enlightenment are an old story, to which Ms. Himmelfarb contributes nothing novel [...] There is undeniably something deeply repulsive about the contempt of some of them for the common people, though Ms. Himmelfarb does not go out of her way to notice that Burke could refer to "the swinish multitude" in the Reflections while arguing elsewhere that the common people were as likely to be right as wrong about the misdeeds of their rulers. [...]

A terminar Ryan, depois de nos recordar que a Guerra Civil Inglesa foi mais sangrenta do que a Grande Revolution; ou que nos EUA houve que combater uma outra Guerra Civil sangrenta por causa do pequeno problema da escravatura, conclui com este coup de grace: The Roads to Modernity is perhaps not to be read as history. It is certainly very entertaining if read simply as a slight essay on some distinguished thinkers. But Ms. Himmelfarb—as her epilogue makes clear—means it as more than that. It is meant to defend the view that America, in its current Republican incarnation, represents what is best in "modernity." And as we know from what she has recently written elsewhere, this includes President Bush's version of the war on terror, his unflinching support for Ariel Sharon's Israel, and his faith-based initiatives in welfare and education. The defense of America also includes belittling the achievements of countries whose inhabitants lead longer and more healthy lives than those of the United States, and whose workers are, on an hourly basis, the most productive in the world. One can only observe that the parochialism, narrowness, and insularity of her political outlook betray the cosmopolitan ethos that her book defends. They are also, and in themselves, silly.

Mas, claro, continuo aberto a argumentos que demonstrem que Bush é um cosmopolita! Na Prospect mais recente, dizem-nos para não perder a esperança, pois uma liberal encapotada sobrevive ainda na Casa Branca: Laura Bush!
 
dezembro 03, 2004
  Piedade senhor povo, vote em mim! Os ataques a Sampaio fazem lembrar a história do homem que matou o pai, mas pede piedade ao juiz porque, coitadinho, era órfão!
 
  Sentido de Estado! Santana Lopes teve um ataque inesperado de sentido de Estado!!! Pena que não tenha sido uns mesitos mais cedo!
 
  Restaurador Olex Meu caro Luis parece-me que andas a fugir dos factos como o diabo da cruz, o que não é nada tipico, ou a abusar do restaurador Olex em quem não tem restauro possivel! Sobre Santana Lopes como primeiro-ministro ser uma garantia de estabilidade não posso acrescentar muito mais. Mas que fique claro que aquilo que o Presidente precisava era que o governo lhe arranjasse pretextos para não o dissolver! Se andasse a preparar-se para o fazer certamente não teria dado a Santana a possibilidade de voltar a reunir-se com ele, e não teria esquecido o formalismo de comunicar a decisão a Mota Amaral! E vale a pena ler isto. Bem sei que se trata de um texto de um perigoso-director-de-jornal-esquerdista-parte-do-complot-contra-Santana, mas os argumentos fazem muito sentido para mim. (Será que faço parte do complot e se esqueceram de me avisar?). O que seria perigoso em termos de precedente no exercicio do poder presidencial seria Sampaio abdicar totalmente do seu poder de afastar o governo, e continuar a tolerar este (des)governo!

Sobretudo, queria recordar que toda esta crise começou com uma quantidade de gestos de figuras do governo no sentido de condicionar a liberdade do comentário politico e a liberdade editorial de TVs e jornais. Estranhamente os blogues que não param de se afirmar liberais, e sempre tão preocupados com o poder de Bruxelas, parecem ter-se esquecido disso!

Não existia crise? Então e a conversa do bébé andar a ser maltratado pelos que o deviam acarinhar? Além de retrato rigoroso de um governo com ocasionais ataques de infantilidade, era "simplesmente" um desabafo inconsequente de um primeiro-ministro que garantia a estabilidade de Portugal?

Finalmente, o que me parece realmente muito misterioso é esta ideia, em que ontem Paulo Portas insistiu, de que o PP foi um exemplar garante da estabilidade. Garante de estabilidade relativamente a quê, se tudo estava bem neste reino da Dinamarca?

PS - E, que mal pergunte, o que é que a invasão e ocupação militar espanhola de Portugal a partir de 1580 tem a ver com a União Europeia? Da qual fazemos parte de livre vontade e que podemos abandonar quando bem entendermos, se assim o desejarmos?
 
dezembro 01, 2004
  Suicídio Acidental Há o suicídio espampanante e histérico, como o de Mishima. Há o suicídio grave e nobre dos romanos. Há o suicídio trágico dos doentes e solitários. Há suicídio táctico dos terroristas. Mas suicídio acidental por sucessivos tiros no pé, confesso que nunca tinha visto ou sequer ouvido falar! Até hoje! E depois ainda há quem venha acusar o médico legista de homicidio por simplesmente registar óbito! Sampaio pode ser parlamentarista, mas não é cego, nem surdo. Seria preciso ser cego e surdo para continuar a pensar que esta maioria com este primeiro-ministro dava estabilidade. Mau para Portugal? Péssimo! (Apesar do Orçamento ainda poder ser aprovado.) Mas pior seria continuar a arrastar o piqueno por montes e vales! Porque, de facto, o Estado faz falta numa sociedade bem ordernada, como se nota quando anda realmente desgovernado! Portanto, o presidente Eanes teve de matar a rainha de Inglaterra. Teve de ser! Há teorias que não resistem aos factos!

 
Este é um blog liberal, cheio de convicções e à procura de patrocínios. Temas? As coisas que realmente (me) interessam. Procuramos, acima de tudo, seguir as máximas do nosso João das Regras «Olhai, porém vede!» e do imortal bispo inglês Joseph Butler, «Things and actions are what they are, and the consequences of them will be what they will be: why then should we desire to be deceived?» Divirtam-se, que nós também. Comentários: BrunoCardosoReis@sapo.pt

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